A poucas léguas de distância do Recife (Praça capital de Pernambuco) situou a natureza uns montes, ou serras, a que chamam guararapes, de tão desmedida elevação, que em algumas partes, levantam a cabeça sobre as nuvens: em partes se abrem em concavidades tão profundas, que a vista lhe não acha termo. Nas fraldas destes montes (que deram nome a duas ilustres vitórias) se dilata uma campina grande, onde, neste dia [19 de Abril], que era Domingo de Pascoela, ano de 1648 se avistaram dois exércitos (Holandês, e Português) pequenos em número, mas grandes pelo valor dos soldados, experiência, e perícia dos Generais. Contava o exército Holandês de sete mil e quatrocentos combatentes da mesma Nação, e da Francesa, Alemã, Húngara, Polaca, Inglesa, Sueca, todos soldados práticos, valerosos, e bem armados. Acrescia um bom corpo de Índios, e negros, seis peças de artilharias, e todas as munições, e armas, que servem em semelhantes casos. Os Generais deste exército, ou Cabos principais dele, eram Sigismundo Vanscoph, Henrique Hus, e o Coronel Brinch, os quais foram escolhidos para esta guerra, como homens aprovados nas de Flandres onde haviam militado com grande nome. O exército Português constava de dois mil e quinhentos soldados, em que entravam dois terços de Índios, e negros; dele era Mestre de Campo General Francisco Barreto de Menezes, e Cabos principais João Fernandes Vieira, André Vidal de Negreiros, Dom António Filipe Camarão, e Henrique Dias. Bem se deixa ver entre um, e outro exército, a desigualdade do número, mas também era em ambos muito desigual, e diferente, a causa. Pelejavam os Católicos pela Fé, pela honra, pela liberdade, pela Pátria, pela fazenda, e em defesa das mulheres, e filhos. Pelejavam os hereges por usurpar o alheio, sem outro direito, mais que o das armas, acompanhado de infinitas exorbitâncias, e tiranias. Deram, pois, os instrumentos bélicos o final de acometer, e deram os Holandeses primeira, e segunda carga, mas a tempo, que pela distância não fez nos Portugueses dano considerável; estes, porém, chegando-se mais perto, empregaram com tanta felicidade os tiros dos seus mosquetes, que logo se viram no campo contrário grandes princípios de confusão, e desordem. e sem mais dilação, nem darem ímpeto, e valor, que em breve espaço romperam os esquadrões inimigos. Era mais duro, e horrível o combate em um alto, onde estes pugnavam por defender a sua artilharia: os nossos por ganhá-la, e ganhando-a com efeito, se aclamavam já vencedores, quando Segismundo, acudiu com mil soldados, que deixara de reserva, os quais até ali descansados, agora resolutos, puseram aos nossos em grande consternação. Cobraram outra vez a artilharia, perdida por eles, e agora mal guardada pelos negros, e Índios do nosso exército, a cujo cargo estava, os quais, divertindo-se em despojar os mortos, se viram carregados com tanta pressa, e força, que sem dúvida pereceriam todos, a não serem socorridos de quinhentos infantes, que os nossos Cabos tinham também de reserva. Aqui se renovou o conflicto, e se pôs outra vez a fortuna indiferente, e quando já parecia, que inclinava para os contrários, então os nossos Genrais ansiosos de venderem a batalha, ou acabarem nela, se arrojaram no maior perigo como soldados particulares, e exortando aos seus, (mais que com palavras) com luzidíssimas provas de valor, assim carregaram aos inimigos, que depois de cinco horas de obstinadíssima peleja, os romperam, e derrotaram com morte de mil e duzentos, em que entraram cento e oitenta Oficiais, e dois Coronéis, um deles Henrique Hus. Dos quais escaparam com vida, a poucos deixou de assinalar o nosso ferro; entre eles, foi Segismundo, ferido em uma perna, de que ficou coxeando em quanto viveu, para que a cada passo, se lembrasse da nossa vitória, e da sua infelicidade. Morreram dos nossos, oitenta e quatro: os feridos passaram de quinhentos: os despojos foram riquíssimos, em que entraram o estandarte da República de Holanda, e vinte e nove bandeiras; ficou prisioneiro o Coronel Kever, soldado de grande reputação. Foi esta vitória de relevantíssimas consequências para a restauração de Pernambuco, como pouco depois mostraram o tempo, e os sucessos.
18 de abr. de 2019
A PRIMEIRA VITÓRIA DOS GUARARAPES (19 de Abril)
A poucas léguas de distância do Recife (Praça capital de Pernambuco) situou a natureza uns montes, ou serras, a que chamam guararapes, de tão desmedida elevação, que em algumas partes, levantam a cabeça sobre as nuvens: em partes se abrem em concavidades tão profundas, que a vista lhe não acha termo. Nas fraldas destes montes (que deram nome a duas ilustres vitórias) se dilata uma campina grande, onde, neste dia [19 de Abril], que era Domingo de Pascoela, ano de 1648 se avistaram dois exércitos (Holandês, e Português) pequenos em número, mas grandes pelo valor dos soldados, experiência, e perícia dos Generais. Contava o exército Holandês de sete mil e quatrocentos combatentes da mesma Nação, e da Francesa, Alemã, Húngara, Polaca, Inglesa, Sueca, todos soldados práticos, valerosos, e bem armados. Acrescia um bom corpo de Índios, e negros, seis peças de artilharias, e todas as munições, e armas, que servem em semelhantes casos. Os Generais deste exército, ou Cabos principais dele, eram Sigismundo Vanscoph, Henrique Hus, e o Coronel Brinch, os quais foram escolhidos para esta guerra, como homens aprovados nas de Flandres onde haviam militado com grande nome. O exército Português constava de dois mil e quinhentos soldados, em que entravam dois terços de Índios, e negros; dele era Mestre de Campo General Francisco Barreto de Menezes, e Cabos principais João Fernandes Vieira, André Vidal de Negreiros, Dom António Filipe Camarão, e Henrique Dias. Bem se deixa ver entre um, e outro exército, a desigualdade do número, mas também era em ambos muito desigual, e diferente, a causa. Pelejavam os Católicos pela Fé, pela honra, pela liberdade, pela Pátria, pela fazenda, e em defesa das mulheres, e filhos. Pelejavam os hereges por usurpar o alheio, sem outro direito, mais que o das armas, acompanhado de infinitas exorbitâncias, e tiranias. Deram, pois, os instrumentos bélicos o final de acometer, e deram os Holandeses primeira, e segunda carga, mas a tempo, que pela distância não fez nos Portugueses dano considerável; estes, porém, chegando-se mais perto, empregaram com tanta felicidade os tiros dos seus mosquetes, que logo se viram no campo contrário grandes princípios de confusão, e desordem. e sem mais dilação, nem darem ímpeto, e valor, que em breve espaço romperam os esquadrões inimigos. Era mais duro, e horrível o combate em um alto, onde estes pugnavam por defender a sua artilharia: os nossos por ganhá-la, e ganhando-a com efeito, se aclamavam já vencedores, quando Segismundo, acudiu com mil soldados, que deixara de reserva, os quais até ali descansados, agora resolutos, puseram aos nossos em grande consternação. Cobraram outra vez a artilharia, perdida por eles, e agora mal guardada pelos negros, e Índios do nosso exército, a cujo cargo estava, os quais, divertindo-se em despojar os mortos, se viram carregados com tanta pressa, e força, que sem dúvida pereceriam todos, a não serem socorridos de quinhentos infantes, que os nossos Cabos tinham também de reserva. Aqui se renovou o conflicto, e se pôs outra vez a fortuna indiferente, e quando já parecia, que inclinava para os contrários, então os nossos Genrais ansiosos de venderem a batalha, ou acabarem nela, se arrojaram no maior perigo como soldados particulares, e exortando aos seus, (mais que com palavras) com luzidíssimas provas de valor, assim carregaram aos inimigos, que depois de cinco horas de obstinadíssima peleja, os romperam, e derrotaram com morte de mil e duzentos, em que entraram cento e oitenta Oficiais, e dois Coronéis, um deles Henrique Hus. Dos quais escaparam com vida, a poucos deixou de assinalar o nosso ferro; entre eles, foi Segismundo, ferido em uma perna, de que ficou coxeando em quanto viveu, para que a cada passo, se lembrasse da nossa vitória, e da sua infelicidade. Morreram dos nossos, oitenta e quatro: os feridos passaram de quinhentos: os despojos foram riquíssimos, em que entraram o estandarte da República de Holanda, e vinte e nove bandeiras; ficou prisioneiro o Coronel Kever, soldado de grande reputação. Foi esta vitória de relevantíssimas consequências para a restauração de Pernambuco, como pouco depois mostraram o tempo, e os sucessos.
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